O silêncio dos inocentes
“Desde início do mundo , as crianças tem sido vítimas de toda a sorte de explorações, inclusive e, principalmente, de natureza sexual . No entanto a sua denúncia tem tido pouco eco, abafada pelo complô do silêncio com que a sociedade, em geral, e os especialistas, em particular, tem procurado encobrir .
O abuso sexual da
criança deve ser visto como uma questão dos direitos da criança, tanto como um
problema de saúde e de saúde mental. A primeira atitude então deve ser a de quebrar
a barreira do silêncio, de modo a tornar mais pessoas
conscientes da
existência deste fenômeno.
O abuso sexual contra a
criança é uma forma presente de violência doméstica,geralmente mantido em
silêncio, mascarado pela revolta, pela conspiração dos sentimentos de
impotência, passividade e submissão. Tem uma distribuição “democrática “
ocorrendo em todos os níveis sócio-econômicos (Santos, 1991 ).
Nos últimos anos tem
havido um aumento de consciência de que a freqüência do incesto é mais alta do
que se imaginava. Isso tem sido enfatizado pela literatura profissional, na
prática clínica e nas agências de cuidados e proteção à infância, que
tem numerosos casos
relatados. Apesar disso, alguns
profissionais ainda escutam os relatos de molestação sexual como
fantasias.
Segundo Rosenfeld
(1979), a linha de demarcação entre a fantasia e a realidade é com freqüência
obscura pois, a fantasia pode ser baseada em experiências reais familiares que
foram deslocadas ou distorcidas. Embora pareça simples separar o que é incesto
do que não é, a realidade das interações familiares confronta-nos com inúmeros dilemas.
Ferenczi, citado por
Rosenfeld ( 1979), notou que muitas crianças pequenas que tinham de fato sido
envolvidas sexualmente com adultos
ficavam freqüentemente confusas se o evento tinha realmente acontecido, uma
confusão que foi atribuída a uma sobrecarga de sentimentos de desamparo
acompanhados pela molestação. Tais confusões podem ser compreendidas não só em
termos do desenvolvimento psicossexual e a repressão do que é traumático mas,
também, em termos de fase do desenvolvimento cognitivo da criança.
Outra dificuldade na
descrição e interpretação dos abusos sexuais em pesquisas é a falta de
organização teórica e conceitual. O que é o incesto ? A resposta à essa
pergunta é bastante complexa e não existe uma concepção única a esse respeito.
Segundo Cohen (1993 (3)), a palavra incesto deriva do latim incestus,
que significa impuro, manchado, não casto, ou seja, in - não e cestus
-puro.
Existem diversas
interpretações quanto à definição do que seja um comportamento incestuoso, e o
fato é que , devido à complexidade do tema, nenhuma delas se mostra totalmente
satisfatória. No entanto, todas as interpretações tem em comum a repulsa ao ato
incestuoso.
Forward e Buck ( 1989 )
diferenciam a visão legal, da visão psicológica . A definição legal trataria o
incesto como a relação sexual entre indivíduos com um grau máximo de parentesco
e que está proibida por algum código religioso ou civil. A abordagem
psicológica, deste fenômeno classificaria o incesto como qualquer contato
abertamente sexual entre pessoas que tenham um grau de parentesco, por
consangüinidade ou por afinidade, ou que acreditam tê-lo. Esta definição
incluiria
padrasto, madrasta,
sogro , sogra, meio-irmão ,avós e companheiros que morem junto com o pai ou a
mãe, caso eles assumam a função de pais.
O Centro Nacional para
crianças abusadas e negligenciadas , com sede nos Estados Unidos, chama o
incesto de abuso sexual intrafamiliar, o qual é perpetrado em uma criança por
um membro do grupo familiar da criança e inclui não somente a relação sexual
mas, também, qualquer ato que tenha por finalidade estimular a criança
sexualmente ou usar a criança para a estimulação sexual do abusador ou de
qualquer outra pessoa.
A experiência do abuso
sexual intrafamiliar assim como outras experiências traumáticas ( tais como , a
guerra, campos de concentração , etc) chamam a atenção sobre o ajustamento
cognitivo e afetivo do indivíduo. “O trauma, no sentido
mais popular do termo, significa
uma quebra de fé”(Winnicott, 1965 ). Segundo Winnicott (1967(12b)), “ o trauma
é um impacto provindo do meio ambiente e da reação do indivíduo a ele, que
ocorre anteriormente ao desenvolvimento, por esse indivíduo, de mecanismos que
tornem a experiência previsível.” É aquilo contra o qual o indivíduo não possui
uma defesa organizada de maneira que um estado de confusão sobrevêm, seguido
talvez de uma reorganização das defesas, estas de um
tipo mais primitivo do
que as que eram suficientemente boas antes da ocorrência do trauma (Winnicott,
1969).
O trauma , portanto,
varia de significado de acordo com o estágio de desenvolvimento emocional da criança.
De início, o trauma implica em um colapso na área de confiabilidade da criança
em um meio ambiente. O resultado de tal colapso mostra-se no fracasso ou no
relativo fracasso no estabelecimento da estrutura da personalidade e
organização do ego ( Winnicott, 1965 ).
Para Cole e Putnam
(1992(4)), a maioria das vítimas de incesto se defronta com múltiplos aspectos
desta experiência:
a) trauma físico e
psicológico na forma de experiências sexuais atuais, incluindo violação do
corpo;
b) extensos períodos de
apreensão , culpa e medo nos contatos sexuais;
c) perda da confiança
nas relações com pessoas emocionalmente significantes.
Observamos os efeitos de
difusão e permanência do estresse no incesto entre os mais importantes domínios
do desenvolvimento da criança, especificamente em termos de desenvolvimento da
auto-integridade física
e psicológica e no desenvolvimento de processos auto-regulatórios,
particularmente na regulação dos afetos e controle dos impulsos.
Schilder , citado por
Arvanitakis (1993),conceituou imagem corporal ou esquema corporal para se
referir a uma estrutura mental integrada da totalidade das experiências
corporais, sensórias, motoras e afetivas. O desenvolvimento da representação do
corpo é um processo dinâmico envolvendo desde o início os estágios
psicossexuais. Está continuamente sujeito a reorganizações e elaborações sobre
a ascendência de diferentes zonas erógenas e relações objetais associadas com
elas.
Uma criança abusada
sexualmente recebendo diretamente sob o seu corpo o impacto do erotismo do
agressor e os impulsos agressivos, deve ficar profundamente abalada pelo
comportamento do agressor e algumas das mudanças que ela pode perceber em seu
corpo ( pênis ereto , ejaculação, etc.) , em adição ao que ela experimenta no
seu próprio corpo. A falta de controle e a inabilidade
da criança para
compreender claramente o que está acontecendo, freqüentemente intensificado
pelo comportamento de negação do agressor da sua contribuição nos eventos,
levaria particularmente à
uma dificuldade da
criança não somente em manter algum nível de realidade , mas , também, em
estabelecer uma clara diferenciação entre o seu corpo e o do seu abusador. Nas
fantasias da criança, o corpo poderia tornar-se o local das mudanças
aterrorizantes e misteriosas, estas gerando ansiedade. Segundo Arvanitakis
(1993), tais representações persecutórias e prejudicadas do
corpo podem levar a
criança à múltiplas somatizações, auto-mutilações e tentativas de suicídio.
Os vários significados
pelos quais a vítima de abuso sexual tenta descarregar , administrar ou
defender-se contra a excessiva estimulação sobre o seu corpo e o efeito de
tempestade que o acompanha - isto é, a dissociação e distanciamento, a
auto-estimulação e a auto-mutilação, a repetição na fantasia e a realidade,
todos esses significados afetarão a representação corporal e , por conseguinte
, a auto-representação.
Para Cole e Putnam (
1992 ), o abuso sexual por um dos pais viola a crença básica da criança sobre
segurança e verdade nas relações , causando distúrbios no julgamento e na
habilidade de ter
relações satisfatórias
nas quais estejam envolvidos sentimentos de amor e proteção. De fato, o suporte
social típico, nas famílias incestuosas , é a força do sofrimento.”
Texto transcrito do
artigo “O silêncio dos
inocentes “- Abuso sexual intrafamiliar na infância - Algumas reflexões
Escrito por Stella Luiza
Moura Aranha Carneiro e Mara Aparecida Alves Cabral
Prisão perpetua nesses pedófilos,são psicopatas não há remédio.
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