Causas da exploração sexual
Transcrito da obra “Guia
de referência – Construindo uma cultura de prevenção à violência sexual “ (*1) , o texto que segue
expõe de forma sucinta os motivos que contribuem para a existência e manutenção
de exploração sexual infanto-juvenil em
nosso país. Nós estamos disponibilizando essas informações aqui no intuito de
promover uma reflexão a respeito desse tema, ao se pensar as causa de tais
práticas, frequentemente o fazemos de forma superficial a partir da visão
limitada do aspecto financeiro. É incontestável que o fator econômico é
determinante nessa realidade, no entanto, é necessário para a compreensão ampla
dessa questão estendermos nossa visão para as engrenagens sócio- culturais que a
constroem. Entender que milhares de meninas
e meninos estão sendo explorados sexualmente cada vez mais cedo simplesmente
por que alguém lucra com isso sem pensar em como o fato de estarmos inseridos
em uma sociedade de consumo que transforma a aquisição de bens de consumo e
serviços como único meio para o bem estar do individuo dispondo o poder
aquisitivo acima de qualquer princípio influencia a existência dessa realidade, não
nos levará a produzir as mudanças necessárias ao enfrentamento desse mal.
Causas da
exploração sexual
A maior
parte das explicações das causas da exploração sexual é, na realidade, uma
tentativa de encontrar respostas quanto aos motivos de certas pessoas para se
engajarem nesse tipo de atividade. Considerando apenas esse aspecto, teremos
uma resposta parcial, e, mais uma vez, o assunto ficará centrado no indivíduo
que oferece os serviços sexuais. Vários segmentos sociais costumavam conceituar
a prostituição como um desvio de caráter ou personalidade, mas hoje vários
estudos concordam com a leitura de que tal fenômeno é provocado por um conjunto
de fatores sociais, econômicos, culturais, entre outros. É importante destacar
que existem divergências em relação aos fatores mais determinantes. Nos países
latino-americanos, constata-se uma tendência
de considerar esse envolvimento como sendo resultante de pobreza. Nos
países desenvolvidos, como sendo resultante de opção.9
Os pontos
de vista também diferem quando se trata de exploração sexual infanto-juvenil ou
prostituição adulta. Assim, enquanto para muitas mulheres adultas a
prostituição é uma opção profissional, ainda que mobilizada pela necessidade de
sobrevivência, os meninos e meninas são conduzidos à prática da
prostituição
pela pobreza.
Aqui
queremos contribuir para desconstruir essa associação mecânica entre pobreza e
exploração sexual infanto-juvenil. Esse argumento não resiste a uma simples
pergunta: “Por que um imenso contingente de meninas pobres não se envolve em
prostituição e encontra outras formas de sobreviver, sem se submeter
docilmente
à sua utilização econômica?” (SANTOS, B. R. dos, 1996). Por outro lado, o caso
de meninas e meninos de classe média que se envolvem em prostituição por razões
de consumo de drogas ou outros artigos de consumo parece também contrariar a
pobreza como fator determinante exclusivo.
Desconstruir
a associação mecânica entre pobreza e mercado sexual não significa negar os
fatores econômicos que “determinam” de certa maneira a existência desse
mercado. Essa questão deve ser abordada na sua complexidade, pois se trata de
um conjunto de aspectos que, combinados em dada família, cidade ou país,
provocam ou conduzem determinadas pessoas para esse tipo de atividade.
Conflitos
culturais e outras situações familiares
Existem
casos de adolescentes que são estimulados ou mesmo forçados pelos familiares a
oferecer serviços sexuais. No entanto, sem estatísticas disponíveis, baseando-se
somente na experiência, sabe-se que o número de casos é bastante baixo. Uma
significativa porcentagem de adolescentes participantes do mercado sexual vive
situações conflituosas com familiares e muitos deles moram fora de casa.
Conflitos familiares não resolvidos, violência doméstica ou negligência dos pais
e familiares e choque de valores levam muitos pais a excluírem e mesmo expulsarem
seus filhos de casa.
Estratégia
de sobrevivência e inclusão na “sociedade”
(de consumo)
Crianças e
adolescentes foram levados a viver em uma condição de dependência dos pais ou
do Estado. Eles não podem trabalhar até a idade de 16 anos ou assinar atos
civis que garantam morar e viver legalmente na sociedade. Quando as crianças e
adolescentes não podem ou não querem viver com a família ou, ainda, a família
não tem condições de alimentar suas necessidades, a venda de sexo pode se
transformar numa opção ilícita de sobrevivência para a realização dos seus
desejos de consumo. Assim, o trabalho sexual se transforma em uma maneira de
ganhar autonomia em relação à família, adquirir bens e serviços que lhes
confiram status social ou simplesmente adquirir drogas.
A omissão ou
insuficiência das políticas sociais públicas
Isso
também pode levar os adolescentes a se engajar no mercado do sexo. Por exemplo,
a falta ou insuficiência de programas de orientação sociofamiliar ou de apoio
financeiro às famílias que vivem em situação de risco. A falta de empregos
dignos para jovens, a baixa qualidade dos serviços existentes para
adolescentes
que têm de viver em lares substitutos ou sob a custódia do governo, a
impossibilidade de suprir crianças e adolescentes com o chamado supérfluo ou mesmo
a violência institucional também influenciam essa opção.
Os motivos
das redes de exploradores
A
exploração comercial de crianças e adolescentes tornou-se um negócio complexo e
lucrativo. Os diversos segmentos sociais que compõem as redes de exploração, muitas
vezes nem tão clandestinas como se poderia supor, são motoristas de táxi, donos
e funcionários de hotéis, motéis e quartos subalugados, gigolôs e cafetinas, vendedores
de roupas e de cosméticos, traficantes, doleiros e policiais corruptos.
A omissão ou
insuficiência da legislação
Permeando
todas as partes envolvidas está a dificuldade de normatizar e de fiscalizar o
cumprimento da legislação e sua aplicação por parte das autoridades e da
população em geral. Esse conjunto de fatores leva à impunidade daqueles que
abusam ou exploram sexualmente as crianças e os adolescentes.Ela faz com que
perdure a violação sistemática aos direitos da criança e do adolescente.
Os valores éticos e as
concepções sobre a infância estão na base do
comportamento social em relação à exploração sexual. Considerando isso,
é importante afirmar que muitas crianças ou adolescentes em situação de risco social
não aceitam o trabalho sexual como opção de sobrevivência, muitos clientes de
prostituição não aceitam ou não desejam ter relação com crianças e
adolescentes, assim como a postura de legisladores e de governantes é determinante
na priorização de ações e investimentos no enfrentamento da exploração sexual.
*1- Guia de referência - Construindo uma Cultura
de Prevenção à Violência Sexual / Childhood Brasil
(Instituto WCF-Brasil)
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